Durante cerca de um ano, dediquei-me a aprender as técnicas, os conceitos, e a estudar a própria história da Fotografia, naquela que considero ser a melhor escola nacional para o efeito. O que me atraiu nessa viagem vai além de gerar imagens com luz e de reproduzir instantes, foi antes a oportunidade de aprender a equilibrar as várias dimensões em simultâneo que fazem parte do processo de fotografar, pois como afirmou Henri Cartier-Bresson: “Photographier cést mettre sur la même ligne de mire la tête, l’œil et le coeur“. Todavia, alinhar a razão, o olhar e o coração requer preparação e astúcia; além de dar foco a tudo o que nos rodeia e a cada coisa em particular é preciso orquestrar o resultado final. Em paisagem, pode ser aguardar que o sol desça ao crepúsculo, ou vigiar uma lua acordada na noite, ou ainda antecipar um céu que se rasgará numa sucessão de espectros azuis. Mas, além dos jogos de luzes e sombras, serve também para inspirar outras possibilidades, como encontrar beleza num campo de trigo hirsuto; procurar o novo numa montanha que existe desde que o mundo é mundo; roubar ao vento aquela ideia sofística de ressurreição no deserto; ou saber calar uma cidade ou mesmo um mar inquietante. Há tempo para enquadrar o formato, decidir a duração da exposição em função do ciclo circadiano. Com empenho e persistência, vai-se de forma resoluta aprimorando a técnica, operando com o olho, sentindo com o coração e acertando com a razão. Em fotografia de espectáculo o tempo é muito mais acelerado e há outras distrações como o ruído, a energia das pessoas que se acotovelam, e o movimento frenético das luzes de palco; na de jornalismo pode haver partes beligerantes e locais onde não apetece estar. Mas em fotografia de retrato o desafio é outro: para um retrato ilustrar verdade é vital reconhecer-se o valor de se estar no presente para não embotar a natureza do momento. Tudo o que é honesto, nasce honesto. Se virmos bem, na vida as coisas acontecem apenas uma única vez, nada se repete da mesma maneira. Tem, portanto, de haver espontaneidade, sagacidade, além de uma certa atitude para se criar sintonia com o sujeito que se vai fotografar, e ambos devem deixar conduzir-se por um mesmo fluxo empático visando chegar à meta: conseguir a fotografia que resulta bem. É certo que na vida às vezes ganhamos e outras perdemos, mas esta noção aqui adquire outra elevação. Em retrato há um momento que é uma expressão, um olhar honesto, mas que se perderá se não estivermos prontos para ele: e, nesse caso, veremos um rosto converter-se em ricto; um olhar apagar-se; uma pose que se desconstrói. São os restos depois da festa que não se desejam levar à objectiva. Era preciso chegar antes, estar lúcido, estar atento e estar pronto pois são muitas variáveis preparadas para desfazer o instante perfeito, e, quando isso acontece, há que saber corrigir, trazer o sujeito de regresso à imagem idealizada, o que nem sempre é fácil, não fosse o ser humano um luxo de características próprias, tantas vezes, comportando uma postura diferente da que lhe pede, ou exibindo um semblante particular que acha resultar melhor, sem antes tentar negociar os seus alvitres. Assim, se quisermos, fotografar é também fazer concessões. No retrato em estúdio há diálogo e troca, mas é preciso praticar o “aqui e agora”, alcançar a atenção plena para não perder o instante crucial. A beleza de fotografar outro alguém está primeiro em descodificá-lo, depois atraí-lo para a nossa imaginação, e permitir que se transfigure naquele lance efémero em que se abandona, entregando-se ao disparo da máquina.
A fotografia é parte integrante d’A Minha Grande Viagem, e o seu cariz de autenticidade é um instrumento decorativo de grande préstimo pois traz verdade e beleza aos textos.




Modelo: Roger Tsikata | Fotografia de estúdio em Restart, 2014