O Ossobó é o pássaro que chama a chuva e, em resposta a esse chamamento, algumas folhas atiram-se das árvores, talvez para se refrescarem soltas no chão quando a chuva vier, ou então são os galhos em jeito de cão que se sacode, desprendendo-as. Oiço o Ossobó cantar e olho as nuvens carregadas ao longe, sabendo que, quando chegarem, essas nuvens irão demorar-se e provavelmente já não terei tempo de fugir. Há dias em que chove muito. As trovoadas descarregam toda a energia do céu, alimentando as raízes das árvores com essa força. Não admira que a vegetação invada tudo. E que as árvores cresçam tanto, circundando-nos, ao ponto de esconderem o mar do lado de lá, a bordejar as margens, despreocupado com este pontinho de terra no Golfo da Guiné. Toda a gente diz que a ilha é pequenina mas a floresta e as montanhas parecem maiores do que o globo terrestre quando nos esquecemos dele. Se calhar é preciso lavar muito bem a nossa História nesta África insular, por meio de uma chuva incessante que tudo afecta. Chove muito e o barco não vem. Chove muito e o avião não levanta. Chove muito e levamos as mãos a proteger a cabeça debaixo das árvores porque é quando os cocos caem. Entre isso e o próprio barulho que a chuva faz, dir-se-ia que a Natureza impera magistral. As estradas transformam-se em lama e os carros entram numa espécie de dança atrasando o destino. Faz parte do ritmo da terra: Leve leve. “A que horas vamos?” – pergunto. “Daqui a pouco” – oiço, numa resposta sem números, sem minutos, sem quaisquer convenções. E até parece que a matemática aqui não se calcula. E até parece que numa ilha tão pequena se perde a noção da geografia. E até parece que são outras ciências estas da chuva e da vegetação que terei de aprender a considerar em cada tarefa diária. Mas às vezes, lá das mesmas alturas, o Sol acorda-me com os seus braços quentes. É fim-de-semana de bonança e quero pôr o pé na água e apanhar conchinhas. Correr para dentro do mar quente. Azul quente. Esmeralda quente. Onde a areia brilha intensa e parece argila de tão macia. É bom entrar num oceano quente levando pés de barro. É bom apanhar um intervalo em que Ossobó esteja a dormir e não chame a chuva. É bom entrar num mar que expande, abre, liberta, que te deixa perder a gravidade e flutuar. As crianças vêm brincar na água, olhar-te com seus olhos negros que brilham ainda mais do que o sol, são 3 irmãs de dez: Flávia, Flaviana e a mais pequenina, Dánia, que te chama “branquinha” e que chora quando a deixas sozinha na areia porque ainda tem medo do mar. E é aí, nesse instante, que a ilha te agarra.



