Santo Sepulcro

The Church of the Holy Sepulchre, em Inglês, soa como é: uma igreja que não precisa de apresentações, e eu, não sendo católica, também não deixo de ser, por nascimento geográfico, cristã. Há talvez por isso certas coisas que me toquem sem encontrar razão. E, nesta viagem, entendi eleger o Santo Sepulcro como a basílica mais bonita entre todas que conheço. Pois, para mim, a beleza está sobretudo na perfeição das pinturas, principalmente pelos motivos ortodoxos e cores matizadas dos tectos. Também pela arquitectura interior do edifício que não se antevê nem adivinha por contraste com as fachadas romanas. Mas ainda mais belo é o detalhe dos candeeiros, na medida certa de luz que cristaliza os objectos, e fruto de um outro brilho de energia extrafísica que impõe a ominipresença de um certo tipo de respeito místico. Além disso, simultaneamente, é dado lugar à pouca claridade natural, que vem de fora mas que se sente ainda mais divina por se saber vinda do céu. E este templo compreende um universo heterogéneo de fiéis, que são simplesmente pessoas que acreditam que antes de tudo, houve um homem que ali foi crucificado e ali renasceu. A igreja veio depois. Destruída e reerguida. E eu, respeito esta capacidade de se aceitar como verdadeira uma sagrada história feita de milhares de anos e, por isso, essa entrega a Deus. E, embora o tempo, sobreviva para tantas pessoas esta devoção declarada que tem o nome de fé. Daí, esta inspiração colectiva de se comprometerem ali, prostando-se (como dizia) a um sentido de entrega que vai além de si mesmas, porque é uma dádiva de tempo, de alma, de buscar alento de volta a si. Regresso à igreja umas horas mais tarde, para tentar descobrir de onde vem realmente aquela beleza que me preenche os sentidos. A essa hora, a luz já é diferente, as pessoas já são outras, mas tudo o resto é igual. Mantém-se uma tentativa de se fazer silêncio e consigo prestar mais atenção. Observo as pessoas nos seus mundos a sós e a sua disponibilidade para existirem ali naquele momento. Vejo-as encostar à chama viva do toucheiro, os molhos de velas novas, que apagam dois segundos depois, e que guardam para reacenderem em casa. Talvez seja possível conter a energia na cera queimada para recuperar mais tarde. Interessa, portanto, levar aquela energia. As pessoas não parecem duvidar do poder dessa entidade. Vejo-as absortas nos seus pensamentos através dos olhares que se demoram nos objectos em volta. Penso que lembram pessoas que perderam para a morte. Mas não sei se perderam, não sei o que é a morte. Mas sinto que, apesar do quase silêncio, se comunicam mortos e vivos. Então, em comum, há-de haver uma união, acima de todos, ou um mesmo sentido de vida que os leva em joelhos a beijar o chão, onde num chão anterior mas no mesmo ponto da Terra, a virgem Maria desmaiou ao ver o filho na cruz. E beijam porque não duvidam. E a serenidade desses momentos de prostração, de meditação e de submissão, que se sente em energia é contagiante. A beleza está no poder dessa evidência empírica. É, de facto, muito belo o encantamento dessa força partilhada que se sente superior, como se todos esses pensamentos únicos se abraçassem num só, e talvez seja isso a beatitude do Amor.

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